Terça-feira, 7 de Setembro de 2010

Noutras eras a aprendizagem das várias artes e ofícios adquiria-se em moldes muito diferentes daqueles que o ensino profissional franqueia ao homem em nossos dias. Não havia escolas públicas onde o aprendiz de qualquer arte se pudesse amestrar. As oficinas caseiras é que ministravam tal ensino. As escolas técnicas são dos tempos modernos. Isto vem para se dizer que assim acontecia com a profissão de boticário. Talvez haja interesse em saber a maneira corrente de aprender esse mester no século de seiscentos. Vai contar--se aqui um caso dessa época que nos dará a perspectiva dos casos similares daquele tempo. Em 1683, um lavrador da freg.a de Galegos, conc.º de Penafiel, resolveu dar a um filho a «arte de boticairo», que entendia «ser officio honroso» e fonte de «amparo e abrigo» para a velhice dos pais. Chamava-se ele Domingos António, casado com Catarina Rodrigues, do lugar de Currais, da dita freg.a. O filho era de nome Manuel Rodrigues e tinha 16 anos de idade, pois nascera em 10-5-1667. Contratou-se o pai para tal fim com o boticário Domingos de Araújo - marido de Josefa Carvalha, da rua de S. Domingos na Cidade do Porto - para ele «aver de lhe emsinar o filho na dita arte de boticairo no espaço de três annos completos e acabados». Pelo seguro, fizeram escritura desse contrato em 20-9-1683. Foi lavrada na nota de Francisco Garcês da Mota, «tabelião público» no conc.º de Penafiel de Souza. Consta desse documento que Domingos António pagaria ao «mestre boticairo» a quantia de «quarenta e dois mil e quinhentos Reis forros e libras e boa moeda das correntes neste Reyno, em dons pagamentos, a saber»: metade, ao começar o referido ensino; o restante depois de o aprendiz estar «emsinado e examinado na dita arte». 0 moço deu muito boa conta de si de modo que, em Maio de 1687, era tido como «capaz de pôr sua botica». Hoje dir-se-ia haver concluído a sua formatura. Restava-lhe, porém, fazer ainda o estágio no exercício da arte sob a vigilância discreta do «mestre boticairo». Para isso eram precisos mais três anos. Cautelosos, também desta vez, o boticário de S. Domingos e o honrado lavrador de Currais fizeram nova escritura de contrato em 25-5-1687. O mestre Domingos comprometeu-se a abrir uma botica nova, com «todo o necessário», que o novel boticário Manuel Rodrigues «possuirá e logrará», por espaço de três anos. Findos estes, seu pai terá de pagar ao Domingos de Araújo cento e noventa e dois mil reis, custo da nova botica, já incluída a percentagem dos medicamentos vendidos naquele espaço de tempo. Este documento tão curioso está no Livro de Notas do tabelião Bento Gomes Delgado, da cidade do Porto, guardado no Arq.° Distrital. É ele o penhor da inteireza da verdade de tudo que se acaba de dizer.

MONAQUINO

Jornal de Notícias de Penafiel, 1969-06-06, p.06

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