A senhora mestra da Doutrina ensinou-me que era muito feio meter-se a gente com a vida alheia; de sermões que ouvi, ficou-me a ideia de que a maledicência é uma erva daninha; doutos moralistas sempre me afirmaram que a detracção era autêntico flagelo social. Com esta formação de escola - como é possível encontrar sabor que me deleite nos escandalozinhos, reais ou imaginários, que surgem todos os dias? Assim, claro está, não me fica bem vir contar um «episódio lamentável», com seu quê de mexerico... No entanto, haverei desculpa se olhar à sua moralidade: em qualquer tempo, o homem é capaz de desvarios quando desamparado do bom senso e desprovido de autodomínio. Seja então! O episódio ocorreu há perto de 250 anos, nos arredores de Arrifana de Sousa. O Abade de Guilhufe e o de Marecos entraram em demanda por causa de umas dúvidas acerca dos limites de suas freguesias, no l. da Póvoa (lugar muito antigo...—cfr. A Ara de Marecos, p. J. de Pinho—Penha-Fidelis). O pároco de Guilhufe - o maiato Bento Correia de Oliveira - conseguiu que o tribunal eclesiástico lhe desse inteira razão: nada menos de três sentenças contra o Abade de Marecos! A capela da Senhora do Desterro, que no Catálogo de D. Rodrigo da C. (1623) vem apontada como ermida de Marecos - ficou dentro da área atribuída a Guilhufe. Os fregueses de Marecos é que não levaram a coisa muito a bem. «Por contemplação» do seu Abade começaram a «fraudar por todas as vias a execução das Sentensas». Entre os desacatos cometidos, conta-se um que vem narrado na Nota de um tabelião do Porto (J. A. de Morais—P. 1—N. 253-4a s.). Vou resumi-lo.
COM A COLOBORAÇÂO DO