Não será impertinência repetir que se engana redondamente quem acreditar nos dizeres da inscrição existente na porta principal da chamada capela de S. Cristóvão, em Penafiel. Aquele despropósito apresenta-se-nos como algo de afrontoso da ilustração dos penafidelenses e deveria ser eliminado em nome do decoro intelectual de todos nós — tanto mais que a capela ainda é hoje pertença da Igreja e não de modo algum propriedade particular. E mais que evidente ser destituída de fundamento sério a data atribuída à erecção do templo, bem como não deixa de ser erro menos crasso a afirmação de ter sido «a primeira matriz de Arrifana de Sousa» — seja no ano apontado de 1741 ou mesmo em qualquer outra época remota. Como já foi exposto, no séc. XVII e XVIII figura na documentação com o nome de «ermida de S. Bartolomeu», pertencente à freguesia de S. Mart.° de Arrifana de Sousa: anteriormente ao segundo quartel do séc. XVI, fora de facto a sede da paróquia de S. Tiago de Louredo, mas nunca poderia ter sido a matriz de Arrifana. Não me parece fácil provar-se que a povoação ou burgo de Arrifana de Sousa fizera parte algum dia da área paroquial de Louredo. O topónimo Arrifana, como já se viu, aparece pela primeira vez no ano de 1258, no final da inquirição concernente à freg.a de S. Mart.° de Moazares, e nunca se encontra registado nos textos referentes à paróquia de Louredo
Nas Memórias do Mosteiro de Bustelo (ms., fls. 122 v.) Fr. A. Meireles diz-nos que o Abade D. Fr. João Anes emprazou a Fernão Gonçalves e sua mulher, em 9-12-1452, «uma morada de casas sitas em Arrifana q. partia com a igreja de Santo Espírito». Não se sabe de quando dataria o templo do Espírito Santo em Arrifana.
Abílio Miranda, no seu opúsculo A Igreja Matriz da Cidade de Penafiel [1942), admite a hipótese de ter sido de fábrica românica, o que não se me afigura muito provável. Seja como for, o que mais interessava ao nosso caso era saber qual a categoria canónica desse templo dedicado ao Espírito Santo. Igreja paroquial ou não, creio bem haver estado sempre na dependência da freguesia de S. Martinho de Moazares e nunca eclesiasticamente subordinada à de S. Tiago de Louredo. Assim penso baseado na convicção de que essa igreja de Arrifana se encontrava edificada num lugar que sempre pertencera à paróquia de Moazares que exercia, por outro lado, o direito de apresentar o pároco na igreja de S. Tiago de Louredo. Demais, no Censual da Mitra (1542), depois de se falar da taxa e apresentação de S. Martinho de Moazares, diz-se expressamente que «a igreja do samto espiritu da Rifana é sua capela». Embora o significado do vocábulo «capela» fosse diferente do sentido que se lhe atribui em nossos dias, é fora de dúvida que não deixava de expressar uma certa subordinação eclesiástica, que neste caso se dava em relação à igreja de Moazares e não à de Louredo. Em suma, não se encontra prova alguma de que a igreja de S. Tiago de Louredo fora em qualquer tempo «a primeira matriz de Arrifana de Sousa».
MONAQUINO
In jornal Notícias de Penafiel, 1970-04-10, p.06